DIVULGANDO A REALIDADE DOS FATOS

eambricardopessanha4

Quando o grito dos maus oprime mais que o silêncio dos bons

Por Ricardo Claudino Pessanha

Correndo o risco de sofrer um linchamento moral e de ser atacado por aqueles aficionados da ideologia do “politicamente correto”, pretendo abordar nas seguintes linhas um tema nada pacífico, porém, extremamente importante para a atualidade, qual seja a verdadeira eficácia do Estado Democrático de Direito no Brasil.

 

A abordagem prévia me permite, inobstante minha juventude e falta de vivência específica do período, relembrar que o país, em um passado recente, experimentou um longo período sob os auspícios de um regime autoritário, cuja marcante foi a tolhida brutal das liberdades, inclusive a de imprensa.

A lembrança ainda tão vívida de tal período na memória do brasileiro me causa perplexidade quando verifico o desprestígio de que hoje goza o Estado de Direito junto aos mais diversos meios de comunicação.

São vários os exemplos recentes ocorridos no país que demonstram como o calor midiático impede ou objurga o cumprimento da lei, em detrimento da satisfação de um clamor popular, muitas das vezes, conduzidos ao arrepio das garantias e liberdades democráticas por instrumentos movidos pelo apetite de audiência e sua gorda consequência financeira. Temos os casos da restrição ao uso de algemas nas prisões, o cumprimento expresso da lei dos ficha-sujas, a garantia concedida por liminar ao banqueiro Daniel Dantas para se calar diante de depoimento à CPI dos Grampos Telefônicos, e as corriqueiras notícias de motoristas supostamente embriagados que não se sujeitam ao uso do bafômetro.

É fato que existem (já as li e ouvi) opiniões contrárias que são, sob o ponto de vista de respeito à ordem jurídica vigente, incompreensíveis e que infelizmente desinformam a grande maioria da população a respeito das verdadeiras garantias constitucionais vigentes no país.

Não há qualquer dúvida de que a liberdade de expressão é um dos pilares das sociedades democráticas e, como só acontecer, a sua proteção também se estende a mais variada sorte de opiniões emitidas para as mais variadas direções. Cabe a nós, como cidadãos, proteger com fúria o direito individual de expor e exercer sua opinião, mesmo que contrárias ao nosso entendimento particular.

Todavia, meu entendimento é de que aqueles possuem espaço junto aos meios de comunicação deveriam ter um maior compromisso com a verdade, fazendo um mínimo de esforço para se informar sobre o que realmente o tema trata, de forma a evitar que se influencie negativamente o pensamento da população e torne ainda mais obscuro o já precário conhecimento da que o brasileiro tem de seus direitos. É o caso do direito ao silêncio.

Tal garantia está firmada no Brasil, consagrada na Constituição Federal junto ao Artigo 5º, inciso LXIII: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”, e após anos de debates e de conquistas democráticas, chegamos à máxima de que “ninguém está obrigado a produzir provas contra si mesmo”.

Inicialmente, cumpre lembrar que é prerrogativa de qualquer pessoa, pelo Pacto de São José, Costa Rica – admitido em nosso ordenamento pelo Decreto n° 678/1992: “…g) direito de não ser obrigado a depor contra si mesma, nem a declarar-se culpada” (art. 8º, Das Garantias Judiciais).

Com efeito, exemplo antipático sob os olhos da população, é o fato que hoje o motorista não pode ser submetido forçosamente ao exame do bafômetro ou a qualquer outro de natureza clínica sem o seu consentimento, sob pena de ferir garantia constitucionalmente estabelecida.

Tal regra é injusta? Não, no meu ponto de vista! As garantias de liberdades democráticas servem a um bem maior que visam impedir que injustiças de caráter muito mais amplo e nocivo se estabeleçam na ordem jurídica do país. Mas isso significa um abono ao mal causado pelo uso irresponsável de álcool por motoristas de todo o país? Também não, porém devem ser encontrados meios eficazes de combater tal mazela sem ferir as garantias democráticas que servem ao bem do cidadão. E a forma de encontrar esses meios é justamente por meio do debate responsável e distante do sensacionalismo midiático.

Se em algum caso, puder se constatar a influência do álcool por elementos exteriorizados objetivamente, então, nesse caso, a prisão há de ser feita com base em testemunhas e não na mera suspeita infundada do policial ou por ordem direta de seus superiores que criaram uma suspeita em abstrato e geral.

Como bem afirmou Rizzato Nunes, desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, “a construção de um verdadeiro Estado Democrático de Direito exige que se lute para que o sistema jurídico vigente tenha validade em todos os casos e para todas as pessoas. É papel dos meios de comunicação informar quais são esses direitos e não ficar dando a entender que eles valem apenas para um grupo de pessoas.

Se, realmente, um cidadão de menor poder social ou aquisitivo estiver sendo violado por quem quer que seja, digamos, por exemplo, no seu direito de permanecer em silêncio, então o caso deve ser denunciado. Não deve servir como fator ou argumento para se defender que outras pessoas não possam exercer esse direito”.

A Justiça, quando instada a se manifestar em situações como as citadas, se efetivamente faz cumprir as garantias democráticas existentes, torna-se “antipática e conivente com as barbáries” perpetradas. Por outro lado, existem aqueles representantes da toga que, por não suportar o peso da função ou por interesse em se autopromover, cedem às pressões dos meios de comunicação, proferindo decisões que aviltam o ordenamento jurídico construído a duras penas por nossos cidadãos.

O que cabe aos meios de comunicação divulgar para a população é a realidade dos fatos e, diante do panorama legal existente, provocar a reflexão dos cidadãos para que por meio de um debate construtivo e técnico, se promova a evolução da legislação que por ventura se mostre obsoleta, inaplicável ou mesmo incoerente com as necessidades do país, sem querer conduzir o Estado de volta a um passado sombrio de restrição das liberdades individuais.

Todas as liberdades cobram um preço caro para serem exercidas e não podemos, pela utopia de sua proposta, querer o melhor dos dois mundos: de um lado, com a efetiva existência e exercício de um Estado Democrático de Direito, na verdadeira acepção da palavra; e, de outro, o controle estatal da vida do cidadão, com a permissão de invasão de liberdades individuais primordiais para o exercício pleno da cidadania, almejado sob o manto de uma Justiça míope exigida pela parcela da população hipnotizada pelos subterfúgios midiáticos.

Assim, ouso humildemente discordar de Martin Luther King, pelo menos nesse exemplo específico, quando afirmo que o grito dos maus é mais nocivo que o silêncio dos bons.

eambricardopessanha4

 

 

 

 

Retornar a pagina inicial

Deixe um comentário

Eu amo meu bairro - Grande Vitória