É preciso dar suporte emocional aos filhos após entrarem para a universidade
A psicóloga clínica Lenita Alves fala sobre importância da relação dos pais como “amigos” de seus filhos no processo de construção de seu amadurecimento. Segundo ela, o tema merece bastante atenção, porque à medida que os pais se debruçam sobre essa “amizade” na relação com os filhos, pode desempenhar um papel bastante importante que é, também, o de formador deste filho neste processo de passagem de jovem a adulto.
“Como os pais podem desenvolver essa ‘amizade’ e ao mesmo tempo ser um formador deste sujeito, uma vez que as opiniões se divergem com a dos filhos? Principalmente, quando há afeto. O afeto cria o interesse genuíno no desenvolvimento deste filho e ele percebe que não é um ‘jogo’ de quem esteja certo ou errado. No caso da relação de amizade desenvolvida, mesmonão concordando com os pais, o filho o respeita, pois ele percebe este afeto nesta relação. Muitos pais e filhos se distanciam por que há divergência de opiniões, mas não existe o afeto que retoma o vínculo entre estes. A questão afetiva, faz com que -consigamos ter a capacidade de dialogar mais com os filhos e, com isso, automaticamente, conseguimos avançar na relação”, diz.
Lenita destaca que quando é preciso enfrentar a vida de forma independente e autônoma, os filhos não possuem “musculatura emocional”, que é a capacidade de conseguir operacionalizar sua própria história, seja diante das demandas, de problemas, ou de sua entrada na “adultez”, podendo se sentir desamparados por seus pais ao ingressar na faculdade, por exemplo. Ela declara que isto pode trazer a sensação de dever cumprido para muitos pais, deixando seus filhos seguirem em frente sozinhos, sem prepará-los para a vida e também no aspecto emocional, que deve ser desenvolvido neste convívio em que há algumas divergências, porém, o interesse genuíno destes pais que este filho consiga encarar sua própria jornada é embasado nesta relação de afeto. E, orienta que os pais se tornem “amigos” de seus filhos, apoiando-os no processo de desenvolvimento e construção do jovem/adulto.
“Como os pais podem construir uma relação de ‘amizade’ na juventude e fase adulta de seus filhos? Pensando na perspectiva do afeto e em sua vivência podemos obter este sentimento através de momentos e atitudes. Um filho percebe o clima de uma casa e como as situações são resolvidas e aprende com isso. Os pais devem ficar atentos ao que este filho se interessa. O afeto está ligado no interesse pelo universo que o outro está vivendo e não apenas operacionalizar, seja logisticamente ou financeiramente, mas um olhar mais apurado sobre os sentimentos/ emoções que permeiam a jornada que este filho está fazendo. Percebemos que muitos jovens, de um modo geral, são levados para a vida sendo cuidados pelos pais, que os proporcionam boas escolas e aparatos financeiros para suas necessidades. No entanto, os pais se esquecem do aparato emocional, que vem a partir do relacionar-se com afeto. Através desta via devemos considerar o processo de amadurecimento dos filhos, trilhando um caminho, onde os pais possam tê-los durante sua formação. Assim, a ‘amizade’ é nutrida. Existem situações que promovem este sentimento, como realizar atividades em conjunto com os filhos, podendo ser pequenas atitudes diárias como alimentar-se juntos – sem uso de TV, celulares e sem pressa. Isso é algo que tem efeito impactante. O ideal é que a ação seja diária. Caso haja dificuldade para criar uma rotina é necessário buscar um momento para que isso aconteça, pois é importante que os filhos saibam que existe um período onde a família se reúne e preza que este tipo de relação”, pontua Lenita.
Como criar relações de amizade com os filhos?
De acordo com Lenita existem formas de os pais criarem relações de amizade com seus filhos. Ela alega que o ser humano fica amigo de alguém, quando tem interesses em comum.
“Amizade é de tolerância a paciência, é longanimidade. Fazer junto, exercita a relação de amizade. Podemos fazer um esporte, um plano, um projeto financeiro, algo relacionado à casa onde moram ou a um carro, entre outras ações. Em minha prática em atendimento psicológico clínico recebo alguns jovens na condição de sensação de abandono pelos pais. Neste caso, percebo que no processo de educação, alguns pais cuidaram de seus filhos, promoveram condições para que eles tivessem boas escolas, cursos, materiais adequados, transportes e todo o tipo de suporte necessário. Passada essa jornada, os filhos foram aprovados no vestibular – interesse final dos pais ou ambos -, e passaram a não ter mais esse tipo de amparo. É como se os pais tivessem a sensação de jornada cumprida e agora fica por conta dos filhos. Por outro lado, os filhos ainda precisam de uma conversa, um abraço, um acolhimento, um estar junto. Minha experiência em consultório apresenta esses jovens perdidos, como se tivessem que dar conta do mundo e não foram treinandos emocionalmente para tal. Muitos deles nunca tiveram, por exemplo, o problema de andar de ônibus porque sempre havia um carro à disposição. Os pais resolviam tudo acerca de documentações e outras questões para eles. Com isso, os jovens não desenvolveram sua capacidade argumentativa. Nessa nova jornada, pós vestibular, a construção do jovem/adulto depende da amizade que deveria ter sido construída, para que eles não se sintam incapacitados e com a sensação que não vão dar conta, o tempo todo”, conclui.